19 de Abril, 2024

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Vida e morte do DLBC (2) – As redes

Uma condição para haja desenvolvimento local de base comunitária é a existência de redes locais, de pessoas, de organizações, de clubes , de colectividades, de autarquias, de centros culturais, de grupos informais de cidadãos, de associações de moradores, de jovens, de escolas e universidades, de empresas enfim, um quadro dinâmico e colaborativo que crie condições para que um objectivo comum seja atingido: agir de forma integrada e articulada no território para melhorar globalmente as condições de vida, de todos e dar passos no sentido de um desenvolvimento mais sustentável.

Mas as redes que devem ser base (e a condição) das iniciativas e acções de baixo para cima têm que ser redes autênticas. Redes com dinâmica de rede, com interacções abertas, não tuteladas nem condicionadas, com uma horizontalidade sem constrangimentos ou barreiras. O objectivo é tirar o máximo de partido das sinergias resultantes das interacções entre os membros da rede, mas é também a aprendizagem do poder partilhado, da auto-organização, da cooperação envolvendo sempre os destinatários das iniciativas que são levadas a efeito.

Os casos bem caricatos das redes que existem e alegadamente funcionam quando estão reunidos técnicos e dirigentes, ou seja, a rede ….é a reunião da própria Rede…deveriam inspirar uma alteração radical no sistema de governança e de dinamização da acção colectiva.

Nesse sentido o próprio sistema de organização e de funcionamento interno da rede tem de basear-se em princípios de flexibilidade, de informalidade, de espontaneidade e até de liberdade porque pode e deve aplicar-se nas redes a regra simples mas essencial para a gestão das questões de poder “entra-se e sai-se quando se quer”.

Mas não é esta a visão aberta, democrática e funcional que tem prevalecido na construção das redes que dão suporte ao DLBC. As redes são propositadamente confundidas com as lógicas associativas, instalam-se mecanismos de poder para perpetuar o domínio de alguns sobre muitos, retira-se aos membros a capacidade de se auto-organizarem e consolidam-se relações de poder baseadas no dinheiro e do direito de o distribuir.

Esta matéria está bem patente no processo interno da Rede DLBC Lisboa que paulatina e progressivamente foi adquirindo um perfil de associação dominada numa primeira fase por algumas organizações e numa segunda controlada por técnicos assalariados da própria instituição ou técnicos representantes de entidades dos órgãos sociais,

O debate e os resultados das sessões de trabalho em torno do modelo proposto pela Caixa de Mitos há mais de ano, quando o assunto se colocou ao núcleo de organizações que então participavam activamente na construção da Rede, foram progressivamente abafados e esquecidos. Através de pequenas objecções, sistemáticas, aparentemente inocentes, sobre este ou aquele domínio, foram remetendo para as calendas gregas as decisões sobre as áreas de auto-organização e foram introduzindo o seu modelo de paixão “o modelo da governação pelos técnicos”, modelo bem conhecido e bem representado em muitas das redes que funcionam de “cima para baixo”.

Será possível colocar debaixo da responsabilidade de grupos de associados todas as áreas assumidas na “Equipa Técnica” de forma individual? Claro que sim. Não há razão nenhuma para que os projectos, a animação territorial, a comunicação, a gestão financeira, etc não sejam geridos por grupos de associados, colectivamente e de forma colaborativa.

E, para além das áreas mais especializadas, a principal função de Animação da própria Rede poder ser desempenhada, de forma rotativa, por períodos até seis meses, por grupos de associados, auto-organizados para aquele efeito.

Outro modelo é possível e desejável.

Por isso a Caixa de Mitos se opôs ao modelo de recrutamento e de constituição da actual equipa técnica da Rede DLBC Lisboa.

Uma solução ideal, com um sistema hiperflexível, descentralizado e de base colaborativa também não seria compatível com a origem dos principais recursos financeiros que a Rede irá dispor nos próximos tempos. Mas seria desejável uma solução mista que desse sinal que uma nova abordagem ao sistema de governança estaria em curso. Mas na verdade não há nem sinais, nem intenções de o instalar.

Não é por acaso que a Rede DLBC Lisboa surge no esquema explicativo da Câmara Municipal de Lisboa na apresentação da estratégia BIP-ZIP nas Boas Práticas URBACT como uma ferramenta da Câmara e como apêndice num sistema de governação liderado, não pelas organizações que dinamizam o BIP – ZIP mas antes pela própria Equipa Técnica da Câmara.

Será difícil perceber que se impõe uma Assembleia das Organizações que dinamizam projectos BIP-ZIP com poderes sobre o Programa? E responsabilizar essas organizações pelas metas do desenvolvimento sustentável no território e não apenas no âmbito restricto da sua área de intervenção?

Não é uma questão fácil de gerir, mas é possível e desejável ir mais longe. Nas opções a tomar neste domínio há inegavelmente muitos riscos.

O pior é nem sequer os equacionar e fingir que se está a mudar, a mexer, para que tudo fique na mesma.

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