É possível ser professor e rejeitar o imperativo da autoconstrução do saber?

Praça das Redes | 5 de outubro 2020 | Carlos Ribeiro | Hoje Dia Mundial do Professor, escrevo duas palavras, corrijo, três ou quatro. A grande angústia do professor é que ele já não é que o que era dantes e não sabe o que é ser depois. Mas com isto pode ele bem.

Problema, problema é a mentira da transmissão.

Disseram que era a essência da profissão, transmitir conhecimentos e sentidos para as coisas e afinal, não é nada disso.

No plano sociológico, há hoje uma clarificação do ser social para o qual a transmissão foi pensada que afasta toda e qualquer atuação que não tenha em conta a subjetivação e o homem plural e, consequentemente, coloque o processo das aprendizagens do lado do aprendente exigindo uma nova relação pedagógica absolutamente ajustada aos mecanismos individuais da apropriação ativa. Mesmo o habitus de Bourdieu, que legitimava tanta coisa nesta esfera, evaporou-se e as abordagens estruturalistas, que emprestavam ao assunto um ar de seriedade inquestionável, caíram em desgraça. Tornou-se impossível ignorar o imperativo da auto-construção do saber.

No plano psicológico, as teorias monolíticas tais como o freudismo e o comportamentalismo (infelizmente para os comportamentalistas já não se pode afirmar que em relação à mente só se consegue medir os stimuli , ou seja as entradas e as saídas, o resto seria uma caixa negra indicifrável), que fazem da aprendizagem um processo principalmente dependente de elementos externos, importa reafirmar que o mecanismo complexo da construção activa dos conhecimentos desenvolve-se de forma exigente no processamento sistemático da informação (percepção, atenção, representações, memorização, problematização, organização cognitiva e metacognição) o que torna o sujeito aprendente muito mais desafiador e coloca os processos de tiro ao alvo do conhecimento transmitido, como algo enfadonho e numa linguagem produtivista, taylorista.

E não são as metodologias activas que alteram a essência da questão. Ser muito dinâmico num processo de transmissão resulta apenas numa transmissão mais animada e menos violenta para o alvo do processo educativo ou formativo.

Mas se as abordagens pela mediação pedagógica são muito mais apaixonantes  e se a desvalorização dos processos prescritivos, de controlo social e de condicionamento que estão associados à transmissão na ação formativa emerge como pouco ou nada interessante, porque é que os professores não rasgam definitivamente o Manual da Transmissão que tanto os angustia?

Carlos Ribeiro, Caixa de Mitos – Agência para a Inovação Social.

Quando os professores e formadores forem artistas sociais

Carlos Ribeiro | Praça das Redes | Coordenador e dinamizador da Caixa de Mitos, 11 de agosto 2020

A propósito das novas tecnologias nas escolas e nos dispositivos de educação-formação.

A invasão descontrolada e acrítica dos meios auxiliares de aprendizagem, principalmente os associados às tecnologias digitais, não facilitará a mudança que se espera e deseja na educação.Na inicial e na de adultos. Esta inversão nos meios poderá complicar e até camuflar os verdadeiros desafios que se colocam ao sistema, aos subsistemas e aos seus actores.

Ambientes pedagógicos

A reformulação dos ambientes pedagógicos que devem abandonar o modelo fabril/taylorista de forma radical e definitiva é sim questão relevante dos tempos que correm. Sem alteração do paradigma dominante não haverá progressão.

Artistas sociais

Espera-se que um modelo dominado pela liberdade e pelo enfoque no desenvolvimento humano de educação adopte como figura central a figura do “professor/pedagogo/artista social” cuja missão fundamental será “construir contextos de aprendizagem” em vez de “animar ou reproduzir conteúdos de manuais que condensam o conhecimento enciclopédico”.

Contextos de aprendizagem

Para cenarizar as aprendizagens todas as tecnologias são válidas, importa é que sejam mobilizadas, na sua diversidade, para qualificar e valorizar os contextos adoptados ou co-produzidos ou seja desenvolvidos com os próprios aprendentes.

Paixão pela educação

Os professores, os formadores os mediadores de aprendizagens não têm que ficar angustiados por terem que adoptar e assumir esta figura do pedagogo/artista social. Podem crer que a paixão pela educação resolve metade das dificuldades que podem emergir neste processo de transformação, que vale a pena viver!

Carlos Ribeiro