10 de Dezembro, 2024

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Economia social e solidária: garante de democracia na transição para a sustentabilidade

Ana Margarida Esteves

As alterações climáticas podem levar a uma nova vaga de autoritarismo. A economia social e solidária propõe um modelo de transição para a sustentabilidade baseado no aprofundamento da democracia.

Entre os próximos dias 6 e 8 de novembro, o ISCTE-IUL irá receber uma conferência internacional sobre o tema. 

A série “O Conto da Aia”, baseada no romance homónimo de Margaret Atwood, ilustra como o colapso ambiental pode levar à morte da democracia: para manter o “status quo”, as elites não hesitam em promover uma interpretação moralista da crise, justificando um regime totalitário que lhes garante prioridade no acesso a bens escassos, neste caso úteros férteis e alimentação sadia. O sexto episódio indica que o regime reduziu 78% do carbono atmosférico em apenas três anos e implementou um modelo agrícola 100% orgânico. A visão distópica de Atwood não é mera ficção: a República de Gilead é uma síntese das derivas autoritárias que devastaram o Ocidente no século XX.

As alterações climáticas ameaçam a sobrevivência da nossa espécie, exigindo um modelo de governança que substitua o crescimento económico por modelos circulares de produção, distribuição e consumo. Como fazer mais com menos sem uma nova deriva autoritária? O discurso da “economia verde” desvia a atenção das estruturas de poder que destroem ecossistemas. Promove uma abordagem individualista e moralizante da sustentabilidade, sobretudo entre classes médias que veem no “consumo sustentável” uma forma de se distinguirem das “massas inconscientes”. Abordagem esta partilhada por alguns “projetos alternativos de sociedade”, nostálgicos de uma ruralidade pré-moderna, que veem na Razão e na Ciência a causa primordial da “destruição da Mãe Terra”. 

A urgência do aprofundamento democrático

De forma a prevenir derivas autoritárias, a transição para a sustentabilidade deverá neutralizar as atuais estruturas de poder e aprofundar a democracia. A economia social e solidária oferece tal perspetiva, ao encarar o tema como sendo do foro da economia política. O seu modelo de governança partilhada, baseado na gestão comunitária dos bens comuns e na valorização dos territórios e da diversidade de saberes, ancora a sustentabilidade ambiental na promoção da democracia participativa e justiça social.

A conferência internacional “Economia Social e Solidária e Movimento dos Bens Comuns”, cuja segunda edição terá lugar de 6 a 8 de novembro no ISCTE-IUL, reúne investigadores, ativistas, empreendedores sociais e gestores públicos para discutir a transição para a sustentabilidade como estratégia de aprofundamento democrático. Esta conferência, aberta ao público, é organizada pelo CEI – Centro de Estudos Internacionais, com o apoio do departamento de Economia Política do ISCTE-IUL, do Centro de Ecologia, Evolução e Mudanças Ambientais (CE3C) da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e a Incubadora de Economia Solidária da Universidade Federal de Alagoas (Brasil).

Este evento insere-se num propósito maior: garantir que a transição para a sustentabilidade não mudará apenas o necessário para “que tudo fique na mesma”… ou pior. 

Socióloga, Investigadora no CEI – Centro de Estudos Internacionais do Instituto Universitário de Lisboa, ISCTE-IUL

Artigo publicado no Jornal de Negócio transcrito na Praça das Redes com a autorização da autora

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